segunda-feira, 21 de março de 2011

Histórias de Amor e Amizade, um conto inédito de Margarida Negrais



( Diálogos improváveis)

1

- Peixinho, peixinho! Que fazes tu aqui sempre à minha volta, que me estás a pôr tonta, apesar de eu ser pedra?
- Tento fugir, tento esconder-me….
- Hi,hi,hi!!! Ai, ai, ai!!! Mas não vás para aí, para debaixo de mim, que me fazes cócegas…
- Mas este sítio é um esconderijo tão bom!
- Sim, mas arranjaremos outro! Afinal…de que foges tu?
- Neste lago onde me puseram, tudo me assusta: a cor escura da água, essas folhas enormes pousadas à superfície, aquele bicho verde com ar guloso!
- A rã? Tens medo da Senhora Rã? Ela é muito simpática, não tenhas medo…
- Tem um aspecto viscoso e repelente…Assusta-me…
- Sim, sim! Mas anda lá, sai daí! Fazes-me comichão com a tua barbatana dorsal…
- Tenho medo de sair…Já viste este monstro vermelho que anda aqui a rondar?... Parece-se comigo, mas eu sou pequenino e preto, e ele é …enorme! Só o olho dele é do meu tamanho!
-Sim, sim, tudo isso é quase verdade! Mas anda lá, sai daí que não aguento as cócegas! Ai, ai! Hi, hi, hi!
- Daqui posso ver o que se passa aí fora…sem precisar de me expor…estas algas e este musgo que te cobrem são uma camuflagem extraordinária!
- Olha ali aquele buraquinho! Nada rapidamente para lá! O peixe vermelho teu parente foi comer à superfície…
- Está bem! Já que insistes…Aí vou eu! …Pronto, já cá estou! Mas fico longe de ti! Snif, snif, snif!
- Sim, mas não chores…Eu protejo-te daqui! Sabes que está a acontecer uma coisa… começo a gostar de ti…Acho que nos vamos dar muito bem…
-Ah! Isso era tão bom! No aquário da loja de animais onde eu vivia éramos imensos, nadávamos numa água muito transparente, para que os clientes nos pudessem escolher…Éramos às centenas! E eu sentia-me apenas mais um…
- Pois, compreendo-te! Sentias-te sozinho no meio dessa multidão de peixinhos… Mas aqui eu vou ajudar-te a sentires-te UM dos mais!!!
-E isso o que é?
- Quer dizer que, embora sejas um peixinho preto precisamente igual a muitos outros, por dentro és tu…diferente de todos, e isso é o que a nossa amizade, ao crescer, te vai mostrar!
-Ai pedra, que bom! Até me apetece chamar-te pedrinha, apesar de seres tão grande e já “entradota”…
- Podes chamar-me como quiseres…Até me podes chamar porto de abrigo, que é o que eu vou ser para ti…
-Porto de abrigo…O que é isso?
-É um sítio onde a água é calma e os barcos podem estar sem perigo.
- Ah! Então é parecido com o que eu sentia ainda agora, quando estava por baixo de ti, nessa covinha…Eu achava que estava aí protegida de qualquer perigo…
- Sim! É isso mesmo! Mas vais ver que daí, desse lugar que vai ser o teu, vais sentir a minha amizade, a minha preocupação contigo, os meus cuidados…Eu estarei atenta para que nada te aconteça…
- Sempre?!
- Bem…Até tu ficares forte, cheia de vigor, aprenderes a não ter medo do peixe vermelho nem de nada, a confiar em ti…
- E achas que isso vai demorar muito tempo?
- A isso só tu saberás responder…
- Queria ir para ao pé de ti… Fazer-te cócegas com a minha barbatana…
-Uhm! Está bem! Vem cá! Só um bocadinho…Pensando bem, há nessas cócegas alguma coisa de agradável…Anda! Vem lá então! Chega cá essa barbatana…


Margarida Negrais 



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